domingo, 21 de junho de 2009

VOTO FACULTATIVO EM PAUTA



Cedido Por: Dr. Zulmir Rasch


Não se sabe ao certo por que razão o voto no Brasil ainda é obrigatório, quando na maioria das democracias representativas o exercício deste direito civil, apesar de importante, é facultativo, cabendo a cada cidadão exercitar o seu livre arbítrio na hora de votar, reservando-se o direito de não comparecer às urnas se não quiser. A essência do voto facultativo é a sua qualidade que o valoriza e pressupõe ampla liberdade do cidadão de votar ou não, deixando falar mais alto a sua consciência política, sem coercitividade constitucional e por auferir melhor a vontade do eleitor.

Os que defendem a manutenção da obrigatoriedade do voto alegam que o povo brasileiro não tem ainda a chamada “ consciência política”, e que seria perigoso, desprovido dela, permitir que praticasse o seu livre arbítrio eleitoral. O que acontece é que muitos políticos - de todos os níveis, e a grande maioria daqueles que vivem à custa de votos, têm verdadeiro pavor de uma eleição desobrigada, pela massa de eleitores que se fariam ausentes, pois sabem que o desprestigio e a descrença do povo com a classe política é abismal, fato comprovado pelas pesquisas abalizadas de opinião pública.

Razões para isso não faltam e são constantemente divulgadas pela imprensa: questões como a infidelidade partidária, quando vereadores e deputados mudam de partido como quem troca de roupa; a corrupção política e partidária que conduz ao enriquecimento ilícito; o fisiologismo político e a demagogia desbragada, são fatores que solapam, de forma irreversível, a confiança do povo nos seus representantes e, por extensão, nos partidos sob cujas legendas se abrigam. É evidente que num regime de livre sufrágio, o número de eleitores interessados em participar do processo eleitoral para a escolha dos seus representantes, sempre será bem menor que num sistema de obrigatoriedade do voto, que inclusive ameaça os abstêmios com multas e outras penalidades. Entretanto, o número de votantes será diretamente proporcional ao nível de conscientização política desenvolvido pela população. Serão esses, porém, votos de qualidade e de consciência, e cada candidato terá que convencer as pessoas a nele votarem com argumentos consistentes e programas de governo factíveis de serem realizados. A credibilidade pública do candidato valerá muito e será decisiva.

É comum ouvir-se de que o voto sendo facultativo favoreceria a sua troca por pequenos favores. Em primeiro lugar, seria hipocrisia afirmar que no modelo atual – do voto obrigatório, não ocorre, em larga escala, a deplorável “venda” do voto, considerado por muitos como coisa natural. Há quem venda o seu voto porque existe quem o compre. Analisando por este prisma, é de se perguntar o que facilitaria mais a troca do voto por pequenos favores, o fato de o eleitor ter que, obrigatoriamente, comparecer às urnas, sob pena de multa, ou, ao contrário, o fato de o eleitor só comparecer à seção eleitoral movido pela sua consciência ? Fica evidente que o voto obrigatório é o indutor dessa “venda” . O eleitor que não tem consciência da importância do seu voto pensa: “se eu tenho que votar, que eu tire algum proveito imediato”! Fortalece essa afirmação o fato de que pesquisas demonstram que mais de 80% dos eleitores não se lembram do nome do deputado federal que votou no último pleito. Tal raciocínio nos leva a afirmar que o voto facultativo, por valorizar o voto de qualidade, por motivar o comparecimento às urnas motivado pela consciência política, pela expectativa de uma representação identificada com suas aspirações, pela confiança num projeto político, levará às urnas o eleitor disposto a investir no futuro do seu Município, Estado ou Nação, que confia na possibilidade da construção de um país melhor para seus filhos ou netos, que acredita que o exercício da cidadania é pressuposto de qualquer Nação. É bom destacar que a adoção do voto facultativo aumentará a responsabilidade dos Partidos Políticos na medida que deverão escolher candidatos identificados com as aspirações da comunidade que pretende representar.

Somos convictos que os resultados de uma eleição com o voto facultativo espelhariam com maior fidelidade a vontade popular. Haveria uma depuração natural, um afastamento pela via democrática dos políticos que não mostraram serviço no decorrer do seu mandato, dos candidatos que demonstram não ter condições para exercer um mandato eletivo. A escolha seria precisa, cristalina e, principalmente, consciente, eis que a grande maioria daqueles que resolvessem votar, obviamente já teriam os seus candidatos, estando imunes, portanto, ao assédio dos “bocas de urnas”. O brilhante senador José Fogaça ao defender a emenda constitucional que altera o caput e o § 1º do art. 14 da Constituição Federal, destacou que “é bom que se ressalte que o direito de escolher, diretamente, seus representantes, é uma prerrogativa inerente à cidadania. O voto é, pois, um direito do cidadão, é a hora sublime do exercício da democracia, visto que é o momento em que o poder é exercido diretamente pelo povo. Ao tornar-se obrigatório, deixa de ser um direito e passa a ser uma imposição. Deixa de ser a livre manifestação para transformar-se em manifestação forçada, que caracteriza ausência de liberdade. O voto facultativo deve ser, portanto, encarado como um direito e não como uma obrigação, um dever”.

fonte: mudabrasil.com



Senadores transformam em PEC sugestão feita por associação de moradores e reacendem debate sobre o fim da obrigatoriedade do voto no Brasil

Fábio Góis

Em época de eleições, a pergunta é recorrente: o voto deve ser obrigatório ou facultativo? Muito é discutido, mas pouco muda no sistema eleitoral brasileiro. Pois a discussão volta com força às vésperas do pleito municipal de outubro. Em junho deste ano, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participa

tiva (CDH) do Senado converteu em proposta de emenda constitucional uma sugestão feita por uma associação comunitária em favor do voto facultativo.

A proposição mantém a obrigatoriedade de o cidadão tirar e guardar o título de eleitor (apenas para efeito estatístico e de cadastro), mas o livra da obrigatoriedade de votar a cada dois ou quatro anos (no caso do DF), como ocorre hoje.

Com parecer favorável do relator, Eduardo Suplicy (PT-SP), a matéria foi encaminhada para a apreciação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, onde aguarda designação de relator.

“Eu vejo que, no processo de aperfeiçoamento da democracia, podemos considerar como didático que tenha havido o voto obrigatório desde a [promulgação] da Constituição de 1988”, disse Suplicy ao Congresso em Foco. Mas, para o senador paulista, a população brasileira já assimilou a importância do voto. “Acho que podemos passar para o estágio do voto facultativo. Portanto, acolhi essa sugestão popular.”

Mudança positiva

Para Suplicy, a não obrigatoriedade do voto pode provocar uma positiva mudança de comportamento por parte dos eleitores. “Será importante passarmos para a fase em que as pessoas votem não por obrigação, mas por vontade.”

O petista disse não ter idéia do tratamento que os senadores darão à matéria em plenário, mas que ela foi bem recebida pelos membros da CDH. “Passou sem objeção. Só na hora do debate vamos verificar o que vai acontecer, não posso adiantar. Há senadores contra e a favor da proposta.”

Convertida na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 28/08 no dia 20 de junho na CDH (leia mais), a sugestão apresentada pela Associação Comunitária de Chonin de Cima (Acocci), de Governador Valadares (MG), visa a alterar o artigo 14 da Constituição Federal, que torna obrigatório o voto no processo eleitoral do país.

País despreparado

A idéia do voto facultativo não é bem vista pelo cientista político Cristiano Noronha, da empresa de consultoria Arko Advice. Noronha discorda de Eduardo Suplicy e crê que a população ainda não está preparada para lidar com o voto facultativo no Brasil.

“Eu sou contra. O Brasil ainda precisa chegar a um estágio de funcionamento institucional e educacional mais elevado para instituir o voto facultativo. As pessoas têm de se conscientizar mais sobre a importância do voto”, declarou Noronha, para quem o país ainda está “institucional e socialmente despreparado” para o voto não obrigatório.

Para o cientista político, o efeito da instituição do voto facultativo no processo eleitoral brasileiro seria negativo. “Teríamos um índice de abstenção, votos brancos ou nulos muito alto, veríamos isso aumentar consideravelmente. Aliás, votos brancos e nulos se transformariam em ausência. O efeito natural disso vai ser o não comparecimento“, argumentou Noronha.

“Do ponto de vista constitucional, não há por que rejeitar [a proposta]. Não se está ferindo nenhuma cláusula pétrea. Mas isso não quer dizer muita coisa”, ressalvou, acrescentando que “temas muito mais urgentes e importantes” que a questão do voto obrigatório devem ser discutidos pela sociedade.

Totalitarismo

Não é o que pensa o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), para quem o assunto é uma boa oportunidade para a “discussão de uma reforma política que não sai do chão” no Parlamento. Segundo o vice-líder tucano, a pertinência do tema é mais uma razão para levá-lo ao debate no Congresso.

“Se o eleitor acha que não tem motivos para dar seu voto, por que ser obrigado a votar? Cabe aos políticos ter mais competência para convencê-los”, completou Alvaro, autor de uma proposição semelhante em trâmite na CCJ do Senado, a PEC 14/2003.

“O voto obrigatório tem sido a marca registrada dos estados totalitários, onde o governante necessita desse subterfúgio para compelir o comparecimento aos pleitos e dar uma aparência de legalidade a um regime de força”, diz trecho da justificativa da proposta de Alvaro Dias.

Obrigatoriedade em xeque

Pesquisa encomendada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) ao Instituto Vox Populi revelou que, se o voto fosse facultativo, 38% dos eleitores não iriam às urnas registrar sua preferência. Entre esses, 30% disseram que “com certeza não iriam votar” e 8% que “provavelmente não iriam votar”.

A pesquisa, realizada entre 27 de junho e 6 de julho com o objetivo de traçar um perfil do eleitor brasileiro, revelou ainda que 51% dos entrevistados disseram que votariam mesmo sem a obrigatoriedade, enquanto outros 11% “provavelmente votariam”. Das 1.502 pessoas consultadas em todas as regiões do país, apenas 1% disse não saber o que responder.

“A possibilidade de a pessoa votar em benefício próprio existe tanto no voto facultativo quanto no voto obrigatório”, disse Suplicy. “Não creio que as pessoas, por causa do voto facultativo, venham se sujeitar a vender seu voto. No [voto] voluntário, no entanto, fica mais difícil fazer [a indução ilegal].”

Desserviço ao país

A posição do senador paulista não é compartilhada pelo presidente da Comissão de Acompanhamento Legislativo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcos Vinicius Furtado Coelho, para quem o voto facultativo seria “um desserviço ao combate à corrupção eleitoral”.

“Com o voto facultativo, haveria a compra da ausência, isso poderia ser controlada pelo corruptor”, disse o advogado, especialista em direito eleitoral. Na avaliação dele, principalmente em cidades pequenas, políticos corruptos poderiam dar dinheiro para grupos de eleitores não comparecerem às urnas e votar nos adversários.

Marcos Vinicius disse ainda que, na prática, o voto facultativo diminuiria a participação popular no processo eleitoral, bem como “a representatividade dos que forem eleitos”.

“Do ponto de vista do fundamento, o voto é um direito e um dever do cidadão, que deve participar da vida política do seu país. [O cidadão] só é obrigado a comparecer, e não a definir seu voto. São obrigações da vida civil” completou o advogado, enfatizando que essa é uma opinião pessoal, e não um posicionamento oficial do Conselho Federal da OAB, do qual é membro.

Caminho longo

Como se trata de alteração na Carta Magna, a PEC 28/08 precisa, caso seja chancelada também na CCJ, da aprovação em plenário de pelo menos 49 senadores, em dois turnos, para depois ser remetida à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

Analisada pelo colegiado, a proposição teria de ser examinada por uma comissão especial antes de ser submetida aos deputados em plenário, em dois turnos de votação. São necessários pelo menos 308 votos (3/5 dos 513 deputados). Caso seja alterada na Câmara, a matéria terá de voltar ao Senado.

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