quinta-feira, 25 de junho de 2009

IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS





G o o g l e cria automaticamente versões em texto de documentos à medida que vasculha a web.
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Introdução
O Imposto sobre Grandes Fortunas
(IGF) inscreve-se na competência da
União, que poderá instituí-lo nos termos de
lei complementar, como soa o art. 153, VII,
da Constituição da República.
Segundo levantamento, tramitam no
Congresso Nacional os seguintes projetos
de lei complementar, visando à instituição
do imposto:
– PLP 162/89, do Senador Fernando
Henrique Cardoso (23-6-89), atual nº 202/
89, ao qual foram apensados os abaixo;
– PLP 108/89, do Deputado Juarez
Marques Batista (6-6-89);
– PLP 208/89, do Deputado Antônio
Mariz (11-12-89);
– PLP 218/90, do Poder Executivo
(Mensagem 315/90, E.M. 063, de 15-3-90);
– PLP 268/90, do Deputado Ivo Cersó-
simo (28-11-90).
Na Comissão de Assuntos Econômicos
do Senado, o PLP 162/89 teve parecer do
relator Senador Gomes Carvalho, que
Imposto sobre grandes fortunas
Olavo Nery Corsatto é Mestre em Direito e
Consultor Legislativo do Senado Federal.
Sumário
Introdução. 1. Configuração pré-legislativa
do imposto. 1.1. Incidência e fato gerador.
1.2. Sujeitos passivos. 1.3. Base de cálculo. 1.4.
Alíquotas. 1.5. Reduções do imposto. 1.6. Lan-
çamento. 2. Considerações do parecer aprovado.
3. Experiência internacional. 3.1. Países que
adotaram o imposto. 3.2. Países que dele
cogitaram ou o aboliram. 4. Análise. 4.1. Carac-
terísticas. 4.2. Defesas e críticas. 5. Conclusões.
Olavo Nery Corsatto
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apresentou substitutivo; e voto em sepa-
rado do Senador Olavo Pires (20-9-80). O
parecer do relator foi aprovado em turno
suplementar (6-12-89).
Na Câmara dos Deputados, onde ainda
aguarda discussão, o mesmo projeto, agora
com o nº 202-B, recebeu pareceres dos
relatores designados pela Mesa em subs-
tituição à Comissão de Constituição e
Justiça e de Redação (Deputado Bonifácio
de Andrada, 14-12-90) e à Comissão de
Finanças e Tributação (Deputado Fran-
cisco Dornelles). E em plenário, foram-lhe
oferecidas vinte emendas, entre elas
destacando-se três, contendo substitutivos:
a Emenda nº 01, do Deputado Aloízio
Mercadante (21-5-91); a Emenda nº 02, do
Deputado Edevaldo Alves da Silva; e a
Emenda nº 18, do Deputado Francisco
Diógenes (16-5-91).
A análise do IGF deverá levar em
conta, além do texto aprovado no Senado
e os projetos e emendas em tramitação na
Câmara, também as manifestações dou-
trinárias até aqui registradas. Nossa
análise, em cada um dos tópicos a seguir,
iniciar-se-á sempre pelo texto aprovado
no Senado, reportando-se aos seus dispo-
sitivos, como no ou do “projeto”.
1. Configuração pré-legislativa do imposto
1.1. Incidência e fato gerador
A incidência constitucional do IGF são
as grandes fortunas (art. 153, VII). O fato
gerador, no projeto, é a titularidade, em
1º de janeiro de cada ano, de fortuna em
valor superior a NCZ$ 2.000.000,00,
expressos em moeda de poder aquisitivo
de 1-2-89 (art. 1º). Fortuna (art. 3º) é o con-
junto de todos os bens, situados no país ou
no exterior, que integram o patrimônio do
contribuinte, exclusive (§ 2º): a) o imóvel de
residência do contribuinte, até o valor de
NCZ$ 500.000,00; b) os instrumentos utili-
zados pelo contribuinte em atividades de
que decorram rendimentos do trabalho
assalariado ou autônomo, até o valor de
NCZ$ 1.200.000,00; c) os objetos de anti-
güidade, arte ou coleção, nas condições e
percentagens fixadas em lei; investimentos
na infra-estrutura ferroviária, rodoviária
e portuária, energia elétrica e comunica-
ções, nos termos da lei; e e) outros bens cuja
posse ou utilização seja considerada pela
lei de alta relevância social, econômica ou
ecológica.
No PLP 108/89, fortuna é a soma dos
bens e direitos de uma pessoa física e seus
dependentes legais que ultrapassem o
equivalente a 2.999.999 BTN, ou expressão
que represente atualização da moeda
(art. 1º, parágrafo único). No PLP 208/89,
grandes fortunas são os patrimônios líqui-
dos de valor superior a 5.000 vezes o limite
mensal de isenção do imposto de renda da
pessoa física, vigorante no mês de janeiro
do exercício de incidência, computadas as
doações feitas no ano anterior (art. 1º),
sendo patrimônio líquido o conjunto de
bens e direitos de qualquer natureza,
emprego ou localização, deduzido o valor
das dívidas de seu titular (§ 1º). No PLP
218/90, grande fortuna é o patrimônio cujo
valor exceder a um milhão de BTN (art. 1º,
§ 1º), sendo o patrimônio constituído de
todos os bens e direitos, de qualquer
natureza, qualquer que seja seu emprego
ou localização, conforme constante da
declaração anual de bens do contribuinte,
diminuído do valor das dívidas (§ 2º),
podendo o Poder Executivo excluir do
patrimônio tributável bens de pequeno
valor de mercado (§ 3º). No PLP 268/90,
grandes fortunas são o conjunto de bens
patrimoniais, físicos e financeiros, que, nos
últimos cinco exercícios, tenha sido infor-
mado à SRF e cujo crescimento, em relação
ao exercício fiscal de 1989, tenha sido
superior a 50% (art. 2º).
Guardadas as variações de projeto a
projeto, verifica-se que, em linhas gerais,
grande fortuna – fato gerador do imposto –
seria o patrimônio da pessoa física, apu-
rado anualmente, cujo valor ultrapassasse
determinado limite. Sua apuração quase
sempre obedeceria a mecanismo, previsto
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em cada projeto, de acréscimos e dedu-
ções. Tal patrimônio seria constituído, por-
tanto, de bens, móveis e imóveis, físicos e
financeiros, e direitos do contribuinte.
1.2. Sujeitos passivos
No projeto, são contribuintes do imposto
as pessoas físicas residentes ou domicilia-
das no País (art. 2º). Os PLP 208 e 218/89
acrescentam as pessoas físicas ou jurídicas
domiciliadas no exterior, em relação ao seu
patrimônio no País (arts. 4º e 5º, respecti-
vamente). Este último elege a pessoa jurí-
dica solidariamente responsável pelo
pagamento do imposto (art. 12). Nada há
a respeito nos PLP 108/89 e 268/90.
1.3. Base de cálculo
No projeto, a base de cálculo do imposto
é o valor do conjunto dos bens que com-
põem a fortuna diminuído das obrigações
pecuniárias do contribuinte, exceto as
contraídas para a aquisição de bens
excluídos (art. 4º). Os bens serão avaliados
(§1º): a) os imóveis, pela base de cálculo
do imposto territorial ou predial, rural ou
urbano, ou se situados no exterior, pelo
custo de aquisição; b) os créditos pecuniá-
rios sujeitos a correção monetária ou cam-
bial, pelo valor atualizado, excluído o va-
lor dos considerados, nos termos da lei, de
realização improvável; c) os demais, pelo
custo de sua aquisição pelo contribuinte.
No PLP 108/89, a base de incidência
será a totalidade dos bens ou direitos
constitutivos da fortuna do contribuinte
(art. 2º). No PLP 208/89, a base de cálculo
é o valor atualizado do patrimônio líquido,
que poderá excluir do cômputo os bens
considerados de pequeno valor do mer-
cado (art. 3º). A lei poderá isentar da
tributação a parcela expressiva do patri-
mônio investida em empreendimentos por
ela considerados relevantes para a econo-
mia nacional (art. 7º), havendo-se como
expressiva a parcela do patrimônio que
representar 25% do capital de uma empre-
sa ou mais de 75% do valor do patrimônio
líquido do contribuinte (parágrafo único).
No PLP 218/90, a base de cálculo é o valor
do patrimônio existente no dia 31 de
dezembro do ano anterior ao exercício
financeiro (art. 3º). O patrimônio, por sua
vez, é constituído de todos os bens e
direitos, diminuído do valor das dívidas
(§2º). No PLP 268/90, a base de cálculo é
a grande fortuna, sem nenhuma dedução.
Como se pode notar, a maioria das
proposições em curso elege como base de
incidência do IGF o patrimônio líquido.
1.4. Alíquotas
No projeto (art. 5º), o imposto incidirá
às seguintes alíquotas:
Classes de valor do patrimônio NCZ$
até 2.000.000,00 ...............................
mais de 2.000.000,00 até 4.000.000,00
mais de 4.000.000,00 até 6.000.000,00
mais de 6.000.000,00 até 8.000.000,00
mais de 8.000.000,00 ........................
Alíquota
isento
0,3%
0,5%
0,7%
1,0%
O PLP 108/89 prevê a seguinte tabela
(art. 2º e anexo):
Classes de valor do patrimônio (em BTN)
até 2.999.999 ..................................
de 3.000.000 até 5.999.999 ...............
de 6.000.000 até 8.999.999 ...............
de 9.000.000 até 11.999.999 ...............
acima de 12.000.000 .........................
Alíquota
isento
1%
2%
3%
4%
É a seguinte a tabela do PLP 218/90
(art. 4º):
Classes de valor do patrimônio (em BTN)
até 1.000.000 ......................................
mais de 1.000.000 até 3.000.000 ...........
mais de 3.000.000 até 5.000.000 ...........
mais de 5.000.000 até 10.000.000 .........
mais de 10.000.000 ..............................
Alíquota
isento
0,1%
0,2%
0,4%
0,7%
Consoante o PLP 208/89, as alíquotas
do imposto serão progressivas sobre faixas
definidas do patrimônio, em número
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mínimo de três e máximo de cinco, não
podendo a menor ser inferior a 0,5% e a
maior a 1,5% (art. 5º). Segundo o PLP 268/
90, as fortunas serão tributadas à alíquota
única de 30% (art. 3º).
1.5. Reduções do imposto
Nos termos do projeto (art. 5º, § 2º), do
imposto calculado o contribuinte poderá
deduzir o imposto de renda e respectivo
adicional cobrado pelos Estados que tiver
incidido sobre os seguintes rendimentos
por ele auferidos no exercício findo: de
aplicações financeiras, de exploração de ati-
vidades agropastoris, aluguéis e royalties,
lucros distribuídos por pessoas jurídicas e
ganhos de capital. Também o PLP 208/89
(art. 6º) prevê a dedução dos impostos
federais, estaduais e municipais incidentes
sobre o mesmo patrimônio, efetivamente
pagos pelo contribuinte no ano anterior.
O PLP 218/90 (art. 7º) dispõe que será
dado crédito do valor dos impostos esta-
duais e municipais, incidentes sobre a
propriedade, efetivamente pagos pelo
contribuinte no ano anterior sobre bens
integrantes da base do IGF até o produto
do valor desses bens pela alíquota do
imposto.
A compensação se faz necessária
porque o fato gerador do IGF inclui bens e
direitos sujeitos à incidência de outros
impostos. Por exemplo, no âmbito da
própria União, os imóveis rurais (ITR); dos
Estados, os veículos automotores (IPVA);
e dos Municípios, os imóveis urbanos
(IPTU). A compensação alcançaria tam-
bém os impostos de transmissão (causa
mortis e doação, nos Estados, e inter vivos,
nos Municípios).
1.6. Lançamento
Pelo projeto, o imposto será lançado com
base em declaração do contribuinte na
forma de lei, da qual deverão constar todos
os bens do seu patrimônio, e respectivo
valor (art. 6º). O bem que não constar da
declaração presumir-se-á, até prova em
contrário, adquirido com rendimentos
sonegados ao imposto de renda, e os
impostos devidos serão lançados no
exercício em que for apurada a omissão
(parágrafo único).
Como se vê, o projeto aprovado, ao
referir-se a “declaração do contribuinte na
forma da lei”, certamente estará elegendo
a declaração de bens do imposto de renda
(Lei nº 4.069/62, art. 51) para o lança-
mento do imposto, o mesmo acontecendo
com o PLP 108/89. Expressamente o PLP
218/90 a designa, porém somente para o
exercício de 1991. Para os seguintes, em
mês a ser determinado, haveria uma
declaração específica do IGF.
2. Considerações do parecer aprovado
Vale a pena destacar, no parecer do
relator do substitutivo aprovado pelo
Senado, em tramitação na Câmara dos
Deputados (PLP 202-B, de 1989), os tre-
chos a seguir:
“O imposto sobre a riqueza não
constitui em qualquer País desen-
volvido receita apreciável para o
erário. É um imposto em extinção ou
reduzido a proporções inexpres-
sivas. O Japão o adotou em 1950 para
aboli-lo em 1953. Na Itália, o impos-
to extraordinário sobre o patrimô-
nio, introduzido em 1946, foi supri-
mido no ano seguinte. Na Alemanha
Federal, o imposto originalmente
fixado em 1% foi depois reduzido
para 0,7%. Persistem enormes difi-
culdades práticas principalmente no
tocante à avaliação ao patrimônio.
Basta notar que, no caso alemão, foi
necessário passar uma lei em sepa-
rado, com 123 parágrafos, sendo que
o comentário dessa lei tem nada
menos que 1.698 páginas.
“Vários países de tecnologia
fiscal avançada como a Inglaterra,
Estados Unidos, Canadá e Austrália,
depois de pesquisas profundas e
inúmeros relatórios técnicos, optaram
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pela não-aplicação, do imposto sobre
as grandes fortunas, preferindo aper-
feiçoamento no imposto de renda ou
impostos específicos sobre deter-
minadas formas de patrimônio...
“Na França, houve várias peripé-
cias. O Governo socialista implan-
tou-o em 1981; o Governo conser-
vador aboliu-o em 1983 e foi nova-
mente introduzido em 1986 com a
volta, ao poder, do governo socialis-
ta. Não é importante fonte de receita
e receia-se que com a liberação do
movimento de capitais, em 1990,
como parte do programa de unifica-
ção européia, venha a se tornar
inviável.
“Conforme o faz notar o Prof.
Henry Tilbery em suas ‘Reflexões
sobre a tributação do patrimônio’, os
argumentos considerados na litera-
tura estrangeira, que desaconse-
lham esse imposto, são os seguintes:
dificuldades administrativas; redu-
ção da poupança interna; resultado
insignificante na arrecadação.
“A esses óbices, no caso brasi-
leiro, se deve acrescentar o perigo da
evasão de capitais. Esta já está se
processando em virtude do risco de
hiper-inflação e da incerteza do
clima econômico, mas sem dúvida
seria incrementada pelo advento do
novo tributo.
“Algumas considerações parece-
riam ainda oportunas, com relação
à superposição tributária. Funda-
mentalmente, o patrimônio é renda
acumulada e os fluxos de renda já
foram sujeitos à tributação ao longo
do processo acumulativo. Donde, na
experiência internacional, não ser o
imposto sobre grandes fortunas
considerado um imposto de arreca-
dação, mas antes um instrumento
adicional de fiscalização. Seu obje-
tivo não é o confisco do patrimônio
e sim um imposto complementar de
renda, através do qual se procura
atingir contribuintes e fluxos de
renda inadequadamente captados
pelo imposto convencional. Visa
essencialmente a ampliar o alcance
da tributação sobre ganhos de capital.
.............................................................
“As características específicas do
Imposto sobre o Patrimônio e a
mudança mundial do enfoque tribu-
tário, do fortalecimento do Estado
para o incentivo ao esforço indivi-
dual, devem ser levadas em conta na
tentativa de regulamentação do
art. 153, inciso VII, da Constituição
Federal. Essas premissas são levadas
em conta no substitutivo.
.............................................................
“O substitutivo mantém as ex-
clusões do imposto sobre o patri-
mônio previstas no art. 11 do proje-
to original, que passam a figurar no
art. 3º, com acréscimo de um item:
– os investimentos na infra-estrutura
de eletricidade, transporte e comu-
nicações. É sabida a insuficiência dos
recursos estatais para esses setores
de base. Na medida em que se per-
mita deduzir do imposto sobre o
patrimônio os investimentos nesses
setores, haveria incentivo adicional
à plena revelação do patrimônio,
pela certeza do contribuinte de que
seus impostos estariam sendo cana-
lizados para setores essenciais. O
rationale é que na maioria desses
setores não existe um mercado
voluntário de financiamentos ou
investimentos, seja por serem mono-
pólios estatais, seja por não serem
atraentes como opções de mercado.
O imposto seria usado como indutor
de aplicações privadas na nossa
dilapidada infra-estrutura. Caberia
à lei ordinária especificar quais os
setores de aplicação válida, quais os
instrumentos a serem utilizados
para comprovação desses inves-
timentos (certificados de compra de
ações ordinárias, preferenciais ou
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debêntures, p. ex.) e o período de ine-
gociabilidade desses instrumentos.
“A grande dificuldade prática –
a vexata quaestio – da imposição de
imposto sobre grandes fortunas,
observada em todos os países que
tentaram cobrar esse imposto, é a
avaliação dos bens que compõem o
patrimônio das pessoas físicas.
Teoricamente o critério ideal seria o
valor de mercado desses bens, mas
a observação demonstra que grande
parte dos bens possuídos, tanto pelas
pessoas físicas como pelas pessoas
jurídicas, não têm valor de mercado
bem definido, e, para muitos bens, é
impossível determinar um valor sem
elevado grau de subjetividade, pois
diferentes avaliadores chegam a
valores diversos.
“A experiência secular da escri-
turação comercial confirma essa
proposição e tradicionalmente a
contabilidade e a lei comercial
prescrevem a avaliação dos bens das
sociedades comerciais pelo custo
de aquisição, e não pelo valor de
mercado.
“Esse problema de avaliação é
agravado no Brasil pelo nosso pro-
cesso inflacionário: todos os bens
mudam constantemente de valor, à
taxa que atualmente é de cerca de
1% ao dia.
“Essa realidade leva o substitu-
tivo a propor, com base na expe-
riência das pessoas jurídicas, que os
bens integrantes do patrimônio das
pessoas físicas sejam avaliados pelo
custo de aquisição corrigido mone-
tariamente, com exceção dos imó-
veis, para os quais se propõe o valor
adotado para efeito de lançamento
dos impostos territorial e predial.
“O custo de aquisição é o valor já
usado pela legislação do imposto de
renda para determinar o ganho de
capital na alienação de bens, e a rigor
é o único valor que pode ser deter-
minado com objetividade para a
maioria das espécies de bens.
“O substitutivo procura, no § 2º
do artigo 4º, precisar o conceito do
custo de aquisição no caso de bens
que são adquiridos sem o paga-
mento em moeda.
“No § 2º do art. 1º, o substitutivo
propõe que o imposto sobre grandes
fortunas seja compensado com o
imposto de renda pago sobre rendi-
mentos de capital, que tem origem
na fortuna tributada. Essa compen-
sação torna mais justa a incidência
do tributo: não satisfaria ao requisito
constitucional da graduação dos
impostos segundo a capacidade
econômica dos contribuintes o paga-
mento do mesmo imposto sobre
fortuna por duas pessoas com bens
de igual valor, se uma aufere renda
destes bens (e paga imposto sobre essa
renda) enquanto para outra a for-
tuna não é fonte de renda tributável.
“O substitutivo prevê que o im-
posto seja lançado com base em
declaração do contribuinte diferente
da declaração do imposto de renda,
embora a omissão de bens nessa
declaração tenha o mesmo efeito de
acréscimo de patrimônio não justi-
ficado na declaração do imposto de
renda, ou seja, autoriza o lança-
mento do valor dos bens omitidos
como renda sonegada ao imposto de
renda.”
As considerações do parecer confir-
mam a tendência da experiência interna-
cional, segundo subsídios que pudemos
reunir e que procuraremos sintetizar.
3. Experiência internacional
3.1. Países que adotaram o imposto
Em palestra proferida em 9-12-93, dis-
se Cid Heráclito de Queiroz
1
que,
“na linha dos meticulosos estudos a
que procederam, países do porte dos
Estados Unidos, Inglaterra, Canadá,
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Austrália, Escócia e Nova Zelândia
nunca instituíram um imposto dire-
to sobre grandes fortunas. Noutros
países, como o Japão, a Itália e a
Irlanda, o tributo foi criado e, poste-
riormente, abolido. Na Itália, aliás,
propostas de reintrodução do aludi-
do tributo foram abandonadas à
vista, principalmente, dos minu-
ciosos estudos do renomado tributa-
rista Victor Uckmar, da Universi-
dade de Veneza. Num terceiro gru-
po, figuram numerosos países em
que o imposto sobre o patrimônio
está em vigor, como a Alemanha, a
Suíça, a Suécia, a Noruega, a Finlân-
dia, a Islândia, a Dinamarca, a
Holanda, o Luxemburgo, a Áustria,
a Espanha e a Índia. Nesses países,
de modo geral, as alíquotas são
módicas, inferiores a 1%.”
A esse rol, acrescente-se a França.
Outro autor que abordou o assunto
entre nós, de forma até relativamente
extensa, foi Henry Tilbury
2
. Segue-se,
abaixo, resumo de seus comentários sobre
a experiência de diversos países a respeito
do imposto sobre o patrimônio.
a) Alemanha
Na Alemanha, o imposto foi concebido
como complemento do imposto de renda,
incidindo sobre o patrimônio das pessoas
físicas e jurídicas, sendo abrandado com
relação a estas, por trazer vários proble-
mas. O problema central, porém, situa-se
na avaliação do patrimônio, a qual é objeto
de uma lei com 123 parágrafos e 1.698
páginas. Há uma declaração do patri-
mônio global, base válida por três anos
para o lançamento anual. A alíquota, que
era de 1%, foi reduzida para 0,7%.
b) França
Na França, l’impôt sur les grandes
fortunes,
“incide sobre o patrimônio mundial
das pessoas físicas residentes no
estrangeiro em relação aos bens
deles situados na França. O imposto
sobre grandes fortunas aplica-se
apenas aos patrimônios superiores a
três milhões de francos, ou even-
tualmente cinco milhões de francos,
conforme o patrimônio inclua ou não
bens profissionais. Ou seja, há uma
isenção para os bens profissionais
em valor até dois milhões de francos.
Portanto, se o valor desses bens
ultrapassa dois milhões, o piso de
três milhões passa para cinco mi-
lhões de francos. Os bens profis-
sionais são definidos de forma mi-
nuciosa, em princípio abrangendo a
ferramenta das profissões indus-
triais, comerciais, agrícolas, artesa-
nais e liberais. O fato gerador é a
posse de bens no dia 1º de janeiro,
sendo base de cálculo o valor venal
real determinado pelo jogo livre de
oferta e demanda. A legislação
francesa também estabelece um
conjunto de normas especiais sobre
a avaliação. A apuração do imposto
é baseada na declaração anual do
contribuinte. Consideramos muito
significativas as normas específicas
para controle das declarações e para
evitar sonegação. Um decreto de
1981 ab-rogou o anonimato com
transações em ouro, anonimato esse
admitido antes daquele decreto.
Além disso, a lei prevê um regime
especial para bens anônimos. Tais
normas demonstram a consciência
do legislador a respeito de possibili-
dades de omissão na declaração de
várias espécies de bens”.
Vale a pena transcrever também o
que ressaltou Cid Heráclito de Queiroz
(op. cit.) a propósito da implantação do
imposto na França:
“Na França, o Governo Raymond
Barre designou, em 1978, uma comis-
são de três sábios – Gabriel Ventejol,
Robert Blot e Jacques Méraud, para
efetuar um amplo estudo sobre os
reflexos da eventual criação de um
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imposto sobre as grandes fortunas.
No final daquele ano, a Comissão
apresentou um minucioso e funda-
mentado relatório, desaconselhando
a instituição do referido tributo. Não
obstante, o governo socialista de
Mittérand criou o imposto em foco,
em 1981, logo cognominado de
‘Robin Hood’, porque o respectivo
produto era destinado a assegurar
uma renda mínima para os mais
desfavorecidos. O imposto foi extin-
to pelo Governo Jacques Chirac, em
1986. E recriado por Mittérand, em
1988, por exigência da plataforma
socialista. Na primeira fase, o Go-
verno francês justificou o imposto
então criado como: a) socialmente
justo, por incidir apenas sobre fortu-
nas superiores a três milhões de
francos, a uma taxa progressiva de
0,5% a 1,5% e abranger, tão-somente,
cerca de 150.000 contribuintes (1%
dos contribuintes do imposto de
renda); b) economicamente razoável,
por ter como base de cálculo o valor
líquido do patrimônio, ou seja,
deduzido o valor das dívidas; e c)
tecnicamente simples, por ter sido
criado por uma lei com apenas dez
artigos.
“Todavia, Pierre Courtois, em
primorosa obra de análise, demons-
trou que o novo imposto francês, ao
contrário: 1º) não era socialmente
justo, porque incidiu sobre trezentos
a quatrocentos mil contribuintes
atingindo numerosos patrimônios
que não podiam ser considerados
como ‘grandes fortunas’; 2º) não era
economicamente razoável, porque, em
período de erosão monetária e reces-
são econômica, uma tributação
conjugada da renda e da fortuna
diminui sensivelmente a rentabili-
dade dos capitais investidos, tanto
pelos empresários, como pelos par-
ticulares; 3º) não era tecnicamente
simples, porque teve de ser regulado
em um Decreto que ocupou duas
páginas e meia do jornal oficial,
complementado por uma Instrução
Geral, com 35 páginas, uma instru-
ção detalhada, com 150 páginas, um
guia de avaliação dos bens, com 200
páginas, e diversos outros atos, num
total de cerca de 500 páginas. E para
analisar essa legislação, Courtois
publicou, em Paris, um livro com
mais de 300 páginas (L’Impôt sur les
Grandes Fortunes), em que adverte:
‘essa prolixidade administrativa é
inevitável”’.
c) Suíça
Na Suíça, o imposto incide sobre o
patrimônio das pessoas físicas e das
pessoas jurídicas, “mas os efeitos dessa
dupla incidência são abrandados por
alíquotas muito baixas, que variam entre
os diversos Cantões, na média entre 1% a
2%”. Relativamente à composição do
patrimônio, as ações despertam “interesse
especial em um país onde o mercado
financeiro tem um papel de maior des-
taque na economia nacional”, particu-
larmente quanto à avaliação daquelas que
não têm cotação oficial.
d) Espanha
Introduzido em 1977, o imposto incide
“sobre o patrimônio líquido das pes-
soas físicas, com isenção de determinados
bens, como imóveis de valor histórico e
obras de arte. O imposto sobre o patri-
mônio é considerado como imposto autô-
nomo, independente do imposto de renda,
com a ressalva de que a soma dos impostos
fica sujeita ao teto que, de 55% da renda
tributável, no início, passou em 1984 para
70% da renda tributável”.
A legislação traz critérios de avaliação,
considerando subsidiário o valor de
mercado.
e) Norte e centro-europeu
Na Suécia, Noruega, Finlândia, Islân-
dia, Dinamarca, Holanda, Luxemburgo e
Áustria, o imposto sobre o patrimônio é
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pago pela renda deste, tendo em vista as
baixas alíquotas. Nos países escandinavos,
as alíquotas (progressivas) ultrapassam
1% (2% na Suécia); nos demais países,
são proporcionais, não superiores a 1%.
Além disso, há um teto para a soma do
imposto sobre o patrimônio com o impos-
to de renda.
f) Índia
Por influência de Nicholas Kaldor,
professor de economia da Universidade de
Cambridge, em 1957 foram instituídos o
annual wealth tax e o gift tax. O imposto
anual sobre o patrimônio líquido incide
sobre os bens das pessoas físicas e das
companhias que excedam determinado
valor, havendo isenções para propriedades
agrícolas, obras de arte, objetos de uso pes-
soal, e, até certo limite, residência própria.
Aquele professor
“parte do princípio de que a renda
não é um parâmetro adequado da
capacidade contributiva, mas que a
posse do patrimônio por si confere
ao indivíduo um poder para gastar,
não atingido pelo imposto de renda.
Portanto, sob a perspectiva de eqüi-
dade horizontal, a imposição da
renda deve ser complementada pela
tributação do patrimônio. Por outro
lado, seguindo as críticas já levan-
tadas antes, principalmente por J. S.
Mills e Irving Fisher, a tributação do
total de renda auferida implica um
gravame em dobro da renda poupa-
da. Portanto, dentro da visão kaldo-
riana, deve ser introduzido um
imposto sobre a renda consumida,
para não desincentivar a poupança,
o trabalho e a aceitação do risco nas
atividades produtoras, em contrapo-
sição à tributação sobre a renda
auferida, que traz no seu bojo esses
efeitos negativos. Observando a
distinção de um lado entre poder de
consumir (spending power), indepen-
dentemente de ser esse poder exer-
cido ou não, e de outro lado o con-
sumo (spending), isto é, o poder de
consumir efetivamente exercido,
chega-se ao núcleo da recomen-
dação, isto é, a complementação
recíproca entre tributação do patri-
mônio, que grava o poderio inerente
à posse de patrimônio, e o imposto
de renda consumida que toma como
medida a capacidade contributiva
revelada pelo gasto, sem discriminar
contra a poupança e sem desen-
corajar o esforço do trabalho. O
expenditure tax recomendado por
Kaldor para a Índia (abolido em
1962) foi um imposto sobre os gastos
da pessoa física no ano inteiro, em
excesso de um certo limite, com
deduções permitidas para várias
espécies de pagamentos, como des-
pesas de casamento de descenden-
tes até certo limite, despesa de
educação no estrangeiro até certo
limite, prêmios de seguros, resgate
de dívidas etc. No que se refere ao
problema administrativo, Kaldor
esperava um efeito controlador
automático pela declaração em
conjunto da renda e do patrimônio.
O sistema integrado de um imposto
progressivo sobre a renda consu-
mida, um imposto progressivo sobre
o patrimônio líquido, complemen-
tado por um imposto sobre doações
introduzido na Índia ao lado do
imposto de renda e imposto sobre
espólios, não produziu um sucesso
inconteste” (sic).
Relativamente ao
“imposto sobre o patrimônio líquido,
originariamente com alíquota pro-
gressiva moderada, seguindo neste
aspecto a recomendação de Kaldor,
foi aumentado gradualmente de
uma escala entre ½% e 1½%, para
uma escala bem mais elevada de 1%
a 5%. Conforme pesquisa de Dr. M.
H. Gopal, o peso combinado entre os
impostos diretos em muitos casos
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102
poderia ultrapassar 100% da renda.
Entre os contribuintes sujeitos ao
maior peso da tributação, a omissão
de parcelas de renda não declarada
aumentou simultaneamente com o
entesouramento de valores oculta-
dos. Conforme opinião do mesmo
autor, um alívio da carga tributária
resultaria provavelmente na recicla-
gem pelo menos de parte desses
recursos em aplicações produtivas”.

“o professor de Economia da Univer-
sidade Hyderabad, Raja J. Chelliah,
primeiramente criticou o expenditure
tax pelas dificuldades administra-
tivas, crítica cuja procedência foi
comprovada pela extinção desse
Imposto após quatro anos de vigên-
cia. Com respeito ao imposto sobre
o patrimônio, pronunciou-se termi-
nantemente contra a sua incidência
sobre pessoas jurídicas, salientando
que a Índia, como país em desenvol-
vimento, não deveria ter seguido
neste aspecto cegamente o exemplo
de alguns países industrializados da
Europa. Por outro lado, o mesmo
autor em princípio concordou com
o imposto sobre o patrimônio líquido
das pessoas físicas, que, na opinião
dele, serve realmente para impedir
o agravamento de disparidades
sociais, apenas recomendando a
elevação do piso da incidência, e
eventualmente um alívio maior do
imposto de renda sobre rendimentos
de trabalho earned income relief,
atendendo ao propósito de maior
diferenciação em cotejo com rendi-
mentos de capital”.
3.2. Países que dele cogitaram ou o aboliram
Registram-se nesse tópico os estudos
levados a efeito por países que cogitaram
– e acabaram, por razões diversas, desis-
tindo – de adotar um imposto geral sobre
o patrimônio. E também a experiência
dos que, tendo-o adotado, posteriormente
o aboliram.
a) Canadá
Comissão presidida por M. Kenneth
Carter (Report of the royal Commission on
Taxation, conhecida como “Relatório
Carter”), em 1966, sugeriu a rejeição,
acatada, de uma imposição anual sobre o
patrimônio, por temer efeito negativo em
relação à poupança. Desde longa data, já
existem, no país,
“impostos sobre parcelas específicas
de patrimônio (property tax), mas de
alcance bastante amplo, embora não
abrangendo o patrimônio global da
pessoa física. O property tax constitui
um elemento essencial na receita
municipal; além disso, existe o
imposto sobre herança (inheritance
tax). Todavia, por enquanto não foi
introduzido no Canadá o imposto
sobre o patrimônio global”.
b) Estados Unidos
Há, no país, desde os tempos coloniais,
um imposto sobre partes do patrimônio
(property tax), de alcance amplo, incidente
sobre o valor bruto de tais partes, mas não
há um imposto anual pessoal sobre o
patrimônio líquido total da pessoa física.
Registra-se ainda um imposto sobre a
herança (inheritance tax). Estudo conhe-
cido como Meade Report deu especial
atenção à origem da riqueza,
“isto é, ou proveniente do produto
economizado dos próprios esforços
de um lado, ou de aquisições gratui-
tas por herança ou doação de outro
lado. Assim, o estudo antes citado
inclinou-se em favor do imposto com-
binado entre tributação progressiva
anual sobre patrimônio e ingressos
gratuitos, pawat, idealizado pelo
Meade report, embora reconhecendo
o problema de avaliação e com res-
salva em relação ao imposto sobre
acessões patrimoniais gratuitas que
seriam uma inovação radical na
legislação norte-americana”.
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Estas últimas mereceriam especial
imposição (acession tax).
c) Grã-Bretanha
No país,
“a introdução de um imposto anual
sobre o patrimônio líquido tornou-
se assunto de discussões políticas na
década de 60. Finalmente em 1974
foi nomeada uma Comissão (Select
Committee on a Wealth Tax), que
publicou seu Relatório conhecido
sob o nome de Green Paper. (...). Nos
estudos promovidos sobre a tribu-
tação do patrimônio pela perspec-
tiva da equidade horizontal, encon-
tramos na Grã-Bretanha uma situa-
ção diversa em comparação com
muitos outros países, pois no orde-
namento britânico já existia antes
uma tributação diferenciada em
relação ao atendimento proveniente
de investimentos. Deste modo, a
introdução do imposto anual sobre
o patrimônio ia substituir a invest-
ment income surcharge ou o sur-tax.
Várias pesquisas encaravam a pro-
blemática sobre este aspecto. (...) O
imposto sobre o patrimônio ia one-
rar automaticamente todo aumento
do patrimônio, não somente em re-
lação ao ingresso de novas parcelas
patrimoniais, mas também abrange-
ria a mais valia de um ano para o
outro dos bens patrimoniais já exis-
tentes. É uma autêntica tributação
da mais valia não realizada, em
contraste com o princípio tradi-
cional que rege a tributação dos
ganhos de capital, que incide somen-
te sobre a mais valia realizada.
Assim, a coexistência dos dois tri-
butos representa um ônus duplo
sobre a mais valia, isto, quando
acrescida, mediante a tributação
sobre o valor enriquecido do patri-
mônio, e outra vez quando a valori-
zação for realizada, pela tributação
do ganho de capital. Isso não signi-
fica necessariamente que haja uma
incompatibilidade absoluta entre os
dois impostos, pois um visa ao
aspecto do fluxo da riqueza (aspecto
dinâmico) isto é, o ganho tratado
como receita tributável, o outro, o
aumento do valor dos bens pos-
suídos (aspecto estático) ou seja, o
incremento da capacidade contribu-
tiva resultante da valorização do
patrimônio, naturalmente quando
real, não apenas inflacionária. Toda-
via, já que tal majoração da capaci-
dade contributiva é apenas latente,
desprovida de liquidez, esse agrava-
mento do ônus parece pouco reco-
mendável. Por esse raciocínio justi-
fica-se a recomendação de Sandford
de que, na hipótese da introdução de
um imposto anual sobre o patri-
mônio, deveria ser reduzida a alí-
quota da tributação de ganhos de
capital. Nas considerações sobre
assunto entre os especialistas ingle-
ses, tomam um lugar de destaque,
assim como em outros países, as
preocupações sobre a avaliação. Foi
sugerido acompanhar o exemplo
holandês, isto é, a avaliação por
declaração do contribuinte sob plena
responsabilidade dele, porém sujeito
à impugnação pelas autoridades.
Uma sanção eventual proposta por
alguns em teoria contra subavalia-
ção consistia na possibilidade ou de
aplicar o valor declarado como base
de indenização na hipótese de desa-
propriação, ou mesmo conceder a
terceiros a faculdade de adquirir os
bens pelos valores declarados que
para esse fim seriam publicados.
Não simpatizamos com tais métodos
de intimidação, mesmo sem exami-
narmos sua viabilidade e eficácia.
Nem nos consta que tal sanção
mencionada nos escritos de vários
autores teria sido implementada na
legislação de algum país. Foi aceita
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104
como ponto pacífico a legitimidade
de uma política fiscal que visa
reduzir a grande concentração de
fortunas em mãos de um pequeno
número de pessoas, como também a
tendência a induzir, pelo sistema de
tributação, a transferência de rique-
za acumulada em valores de abso-
luta esterilidade para aplicações
produtivas. Todavia, a maioria das
opiniões, diante dos problemas
administrativos, se inclinou em
favor da tributação não sobre o
estoque do patrimônio, mas sobre
sua transferência a título gratuito.
Como salientou o Relatório Meade, a
tributação da transferência de patri-
mônio também é preferível pelo fato
de causar menos dificuldades e
custos administrativos do que o
imposto anual sobre o patrimônio.
Embora parecesse que, no plano
doutrinário, as teses do Meade Report
tivessem alcançado amplo consenso,
principalmente a rejeição do impos-
to anual sobre o patrimônio e a
preferência do imposto sobre ingres-
sos patrimoniais gratuitos, na práti-
ca, não foi implementada na legis-
lação britânica, por enquanto, ne-
nhuma dessas reformas básicas da
tributação direta (nem o pawat, nem
o annual wealth tax, AWT, nem o
expenditure tax, nem o acession tax)”.
d) Irlanda
Após profundos estudos, em 1974 foi
introduzido, na República da Irlanda,
como tributo que parecia bem elaborado,
o imposto anual sobre o patrimônio. Já em
1978, porém, foi revogado.
e) Itália
Em 1946, esse país instituiu um imposto
extraordinário sobre o patrimônio, supri-
mindo-o em 1947. Estudos
“organizados pela Universidade de
Veneza em 1985 deram origem a um
trabalho do preeminente tributarista
italiano Victor Uckmar, que, além de
um relatório do direito comparado
– que é o resumo mais atualizado e
mais abrangente do qual temos
conhecimento –, dedica atenção
especial a esta problemática sob a
perspectiva da Itália. Da mesma
forma como outros pesquisadores,
esse cientista italiano opina que a
eficiência dessa tributação depende
do grau de confiabilidade do levan-
tamento do patrimônio e dos crité-
rios de avaliação. Foi esse um dos
argumentos principais que motiva-
ram a conclusão desse autor, contrá-
rio à introdução desse imposto, pois
considera a Administração Tribu-
tária da Itália não suficientemente
aparelhada para esse fim, nem para
os impostos já existentes”.
f) Japão
Em 1950, obediente a recomendações
de 1949 da Shoup Mission, de peritos ame-
ricanos, o Japão instituiu imposto anual
sobre o patrimônio, abolindo-o em 1953,
por ter apresentado pífios resultados na
arrecadação e falhado como instrumento
contra a evasão do imposto de renda,
atingindo quase apenas o patrimônio
imobiliário. Concebido como suplemento
do imposto de renda,
“não foi considerado adequado para
medir a capacidade contributiva.
Uma das principais razões de sua
abolição foi a dificuldade de revelar
a totalidade dos bens patrimoniais
do contribuinte, com respeito a
certas espécies de bens como dinhei-
ro, jóias e valores mobiliários. Esse
fato causou um desequilíbrio em
comparação com a propriedade
imobiliária, que é de fácil identifica-
ção. Outro problema foi a avaliação,
especialmente em relação a imóveis
e a participações societárias não
negociadas publicamente”.
O economista japonês Noboru Tanabe
“reconhece plenamente os méritos
do imposto anual sobre o patrimô-
nio, principalmente pelo aspecto de
maior eqüidade horizontal e ver-
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105
tical, além de servir como instru-
mento de reforma socioeconômica,
principalmente em países em desen-
volvimento para corrigir a concen-
tração de riquezas. Além disso pode
incentivar a aplicação de poupança
em investimentos produtivos, con-
siderando que a posse de bens se
torna menos interessante quando
nem produzem renda suficiente
para fazer face ao pagamento do
imposto sobre patrimônio. Não
obstante essas vantagens e resulta-
dos positivos alcançados por essa
tributação em países europeus, o
autor conclui que as dificuldades
administrativas que o Japão não
conseguiu vencer foram o motivo
principal para o abandono desse
imposto, além do modesto resultado
da arrecadação”.
4. Análise
4.1. Características
Como demonstram as propostas e a
experiência internacional sumarizadas, o
IGF pode assumir desenhos ou caracterís-
ticas mais ou menos variáveis em seus
aspectos – incidência, sujeitos passivos,
base de cálculo, alíquotas, lançamento.
Pontos que se pode considerar pratica-
mente convergentes são a incidência e a
base de cálculo. É quase unânime que o
imposto deva incidir sobre a totalidade do
patrimônio, admitida a exclusão de bens
de interesse para o desenvolvimento
econômico e social. E a sua base de cálculo
deva levar em conta – e, portanto, também
à exclusão – os valores já onerados pelos
tributos sobre itens específicos do patrimô-
nio, como imóveis urbanos e rurais,
veículos, participações societárias, fundos
etc. Ou seja, o imposto incidiria sobre o
patrimônio líquido, sendo seu valor líquido
a base de cálculo. A fortuna tributada,
por sua vez, deveria ser, realmente, de
grande vulto.
Com respeito aos sujeitos passivos, há
forte preponderância em limitá-lo às
pessoas físicas, somente uma minoria
fazendo-o alcançar também as pessoas
jurídicas. As unidades produtivas assim
estariam a salvo do imposto, também em
nome do desenvolvimento econômico
(produção) e social (geração de empregos).
As tendências se dividem quanto à
administração e ao lançamento. O lança-
mento teria por base a declaração de bens
do imposto de renda ou uma declaração
específica do patrimônio para o IGF.
Quanto às alíquotas, prepondera a
tendência de adoção de alíquotas progres-
sivas baixas, entre 0,l% e l% (ou, quando
muito, e raro, 2%), ou então uma alíquota
proporcional também baixa. Uma pequena
minoria sugere a adoção de alíquotas
superiores a 2%. Alíquotas entre 5% e 30%
já foram adotadas (uma só vez), em
ocasiões de catástrofe nacional, por países
que tiveram de superar as imensas dificul-
dades advindas das primeira e segunda
guerras mundiais, por exemplo.
A propósito, embora o imposto se
denomine “sobre grandes fortunas”, na
realidade ele seria pago pela renda por elas
gerada, sem desfalcar o patrimônio em sua
substância. É por isso que a doutrina o
considera imposto nominal sobre as gran-
des fortunas, porém suportado pela renda
destas, o que leva à fixação de alíquotas
reduzidas.
4.2. Defesas e críticas
A adoção ou não e o abandono do IGF
decorreram de suas supostas virtudes e
defeitos.
São virtudes apontadas por Henry
Tilbury (op.cit.) a eqüidade horizontal, a
eficiência na aplicação de recursos, a
redistribuição de riquezas e o controle
administrativo.
A eqüidade horizontal, segundo aquele
autor,
“parte da constatação de que a
renda do indivíduo não é por si só o
parâmetro adequado para medir a
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106
capacidade contributiva, relem-
brando o famoso exemplo de Nicho-
las Kaldor, que comparou a capaci-
dade contributiva totalmente desi-
gual de um homem rico, cujo patri-
mônio é aplicado em bens, que não
produzem renda, e, de outro lado, do
homem muito pobre, também sem
renda”.
Para ele a tributação anual do patri-
mônio, portanto, pode ser encarada como
complemento que está suprindo as falhas
do imposto de renda, já que este não
alcança, em sua totalidade, a capacidade
contributiva. Aduziríamos que seria
complemento também dos demais impos-
tos patrimoniais, incidentes especifi-
camente sobre os imóveis urbanos e rurais,
os veículos, os fundos, etc.
O mesmo autor diz que se, por um lado,
o imposto de renda pode, em tese, “desen-
corajar pessoas de intensificarem seus
esforços de trabalho ou para aceitarem os
riscos inerentes a empreendimentos pro-
dutivos”, de outro lado, o IGF induziria a
transferência de valores investidos em
bens improdutivos para aplicações produ-
tivas para, pelo menos, “gerar uma renda
suficiente para pagar o imposto sobre o
patrimônio”.
A redistribuição da riqueza seria outro
efeito benéfico do IGF, que funcionaria
também como instrumento de controle da
administração tributária, mediante o
cruzamento de dados com base nas decla-
rações da renda auferida, dos bens para o
IR ou o IGF e das parcelas do patrimônio
consideradas para tributações específicas.
Haveria, assim, menor possibilidade de
evasão de diversos tributos.
Ainda para o referido autor, os defeitos
do imposto seriam as dificuldades adminis-
trativas, a redução da poupança interna e
o resultado insignificante da arrecadação.
Segundo ele, as dificuldades administra-
tivas seriam o problema de conseguir-se dos
contribuintes uma revelação (disclosure)
completa de todos os seus bens e, em
decorrência, uma avaliação correta do
patrimônio de cada um. Difícil seria
avaliar, por exemplo, “bens que podem ser
facilmente ocultados, como jóias, metais
preciosos, títulos ao portador, objetos de
arte etc.”. Isso teria levado o Japão a abolir
“um imposto cuja aplicação abrangente e
justa se comprovou como sendo inexe-
qüível”. E quem não o aboliu, como a
Alemanha, erigiu uma legislação extensa
e complexa para regulá-lo. O autor aponta
ainda para o fato de o contribuinte, além
de omitir bens, em geral subavaliar os
declarados. Para a administração, a
avaliação
“cria enormes dificuldades, não
somente à escolha de critério ade-
quado para as várias espécies de
bens, mas também em relação, por
exemplo, ao valor venal, sendo esse
o critério principal que deveria ser
efetivamente estabelecido para uma
quantidade enorme de bens”.
Embora não impressionado com o
“argumento de uma eventual ameaça de
fuga de capitais para o exterior, que
geralmente está motivada por outras
considerações, mas não por um imposto
(por exemplo) de 1%”, o citado autor não
duvida de que “o argumento da redução
da poupança procede. Em um país em
desenvolvimento, não é interessante
desincentivar a poupança”. À redução da
poupança interna somar-se-ia o desestímulo
à interiorização de capitais externos,
acrescente-se.
O imposto geral sobre o patrimônio não
tem rendido o esperado onde foi instituído.
Para o citado autor, esse argumento,
freqüentemente mencionado, de sua
minúscula arrecadação, por si só, não é o
mais importante. Para ele, o que “pesa
gravemente na balança é mesmo a invia-
bilidade virtual administrativa”, porque a
“desproporção entre custos admi-
nistrativos do imposto patrimonial
e o resultado moderado da arreca-
dação é provavelmente válido em
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107
todos os países, mas não deveria ser
considerado como decisivo no Brasil,
quando o que se visa é maior justiça
fiscal e prevenção da excessiva
concentração de riquezas”.
Que o imposto sobre a riqueza não cons-
titui, nos países desenvolvidos, receita
apreciável para o erário é conclusão que
se impõe. Num país em desenvolvimento,
como o Brasil, ainda não se dispõe de
elementos – como dados estatísticos
idôneos – sobre os quais se possam desen-
volver projeções que possibilitem uma
avaliação correta da provável arreca-
dação do imposto.
5. Conclusões
Se vier a ser instituído, o IGF será outro
entre os demais impostos sobre o patrimô-
nio existentes em nosso sistema tributário,
que são:
I – considerado o patrimônio no seu
aspecto estático:
a) imposto sobre a propriedade terri-
torial rural (ITR), de competência da
União (CF, art. 153, VI);
b) imposto sobre a propriedade de
veículos automotores (IPVA), dos Estados
e Distrito Federal (art. 155, III);
c) imposto sobre a propriedade predial
e territorial urbana (IPTU), dos Municípios
e Distrito Federal (art. 156, I);
II – considerado o patrimônio no seu
aspecto dinâmico:
a) imposto sobre a renda e proventos
de qualquer natureza (IR), da União
(art. 153, III), que grava os acréscimos
patrimoniais;
b) imposto sobre a transmissão causa
mortis e doação, de quaisquer bens (ITCM),
dos Estados e Distrito Federal (art. 155, I);
c) imposto sobre a transmissão inter
vivos, a qualquer título, por ato oneroso,
de bens imóveis por natureza ou acessão
física, e de direitos reais sobre imóveis,
exceto os de garantia, bem como cessão de
direitos a sua aquisição (ITIV), dos Muni-
cípios e Distrito Federal (art. 156, II).
Considerado o patrimônio objeto dos
impostos existentes, o IGF viria a consubs-
tanciar: (1) imposto suplementar, por
constituir uma superposição (legal) da
tributação já existente, da qual seria
parcela adicional; (2) imposto complementar,
por haver escapado dessa mesma tribu-
tação, via evasão fiscal; (3) imposto novo,
para as parcelas de patrimônio não alcan-
çadas por nenhum dos impostos existentes.
Às alíquotas do substitutivo aprovado
no Senado, o IGF viria a constituir-se, sem
dúvida, fonte nada desprezível de receita
para o erário, considerado o inegável (e
ainda não mensurado) índice de evasão
fiscal no País. Como se disse acima, por
falta de dados estatísticos confiáveis,
ainda não é viável dimensionar-se proje-
tivamente o valor da arrecadação prová-
vel do IGF. Isso seria possível, a curto
prazo, somente com a colaboração dos
Poderes Executivos da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios. Já é
tempo, aliás, de o Congresso Nacional
obter, compulsoriamente como lhe faculta
a lei, todos os subsídios e informações
necessários à avaliação dos efeitos eco-
nômicos e financeiros das proposições que
estão ou venham a estar em curso.
Nada mais oportuno do que isso, no
momento em que se propõe uma nova
reforma tributária, para cujo exame
criterioso e aprofundado não poderá o
Congresso prescindir de elementos que só
os Poderes Executivos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Muni-
cípios estão em condições de fornecer.
O que se disse vale para o IGF, cabendo
preliminarmente indagar se ele perma-
necerá ou não no sistema. Caso perma-
neça, juntamente com os demais impostos
patrimoniais, a questão primordial sobre
a sua conveniência ou não, a nosso ver,
reside no efeito psicológico que poderá
produzir a sua instituição. Há dias, em
entrevista na Imprensa, o Senhor Depu-
tado Roberto Campos, que também já se
manifestou sobre o IGF, afirmou que “o
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108
capital é covarde como um cordeiro e
veloz como uma lebre” para safar-se. Será
necessário, por isso, antes de tudo, consi-
derar se o IGF não desestimulará o ingresso
de capitais no País. E se, não obstante as
baixas alíquotas, será ou não fator de
desistência para quem se disponha a
transferir para cá sua poupança, temendo
elevações no futuro. É por isso necessário
salientar que o art. 150, IV, da Constituição
é garantia de que o imposto jamais poderia
atingir a substância do patrimônio, porque
o dispositivo veda a utilização do tributo
com efeito de confisco.
A criação ou não do imposto, no bojo
da reforma tributária, deveria ser prece-
dida de amplo debate dentro e fora do
Congresso Nacional, ouvidos especialistas
nas áreas econômica, financeira e tribu-
tária, devendo a discussão arrimar-se em
dados estatísticos objetivos das arreca-
dações (federais, estaduais e municipais)
dos tributos patrimoniais existentes, do
levantamento das grandes fortunas do
País e respectivos possuidores, cujo núme-
ro, acredita-se, seria significativo. E no
caso de decidir-se pela sua adoção, o
desenho que melhor se coaduna à expe-
riência internacional, aos estudos a lume
entre nós e às características retromen-
cionadas, parece-nos ser o constante do
substitutivo em apreciação na Câmara dos
Deputados. Merecem ainda leitura os
trabalhos de Francisco de Paula Giffoni
3
e
Hugo de Brito Machado
4
, além dos já
citados ao longo deste breve estudo.
Como um debate nacional amplo e
prévio sobre o assunto tem poucas proba-
bilidades de acontecer tão cedo (porque
dependeria de prévia coleta de elementos
de nossa realidade política, econômica e
financeira), acreditamos que as seguintes
razões justificariam a criação do IGF,
ainda que em caráter experimental:
1) a distribuição da renda e da riqueza
nacionais é extremamente assimétrica e
perversa;
2) o IGF seria, por isso, importante
instrumento de justiça fiscal;
3) o número de contribuintes do IGF
seria limitado e relativamente pequeno;
4) o número limitado de contribuintes
facilitaria a administração e o controle do
imposto;
5) o IGF seria também instrumento de
controle do imposto de renda e dos demais
impostos sobre o patrimônio;
6) conseqüentemente, seria também
instrumento de controle da evasão fiscal,
o que o reforçaria como fator de justiça
fiscal;
7) ao fato de alguns países não have-
rem adotado um imposto geral sobre o
patrimônio e de outros o haverem aban-
donado se contrapõe o fato de que países
de expressão política e econômica inter-
nacional persistem nele;
8) isso significa que somente experi-
mentando-o é que viremos a saber se ele
seria ou não vantajoso para o País;
9) mesmo que o imposto não venha a
ser importante instrumento de arrecada-
ção, a sua receita seria muito bem-vinda
no momento em que o País realiza enorme
esforço para equilibrar suas finanças;
10) como última e fundamental ratio,
acrescente-se que o IGF está previsto na
Carta Magna.
Notas
1
QUEIROZ, Cid Heráclito. Liberdade e patrimônio:
o imposto sobre grandes fortunas. In:Carta Mensal. [S.l.:
s.n.], v. 39, n.467, fev. 1994. p. 13 - 23.
2
TILBURY, Henry. Reflexões sobre a tributação do
patrimônio. In: Imposto de renda - estudos 4. São Paulo:
Ed. Resenha Tributária, 1987. p. 283 - 347.
3
GIFFONI, Francisco de Paula. Memorando para
anteprojeto da regulamentação de imposto sobre o
patrimônio líquido pessoal ou grandes fortunas. In:
Revista de Finanças Públicas. Brasília : [s.n.], jul./ago./
set. 1987. p. 31 - 38.
4
MACHADO, Hugo de Brito. Imposto sobre
grandes fortunas. In: O Sistema Tributário na Nova
Constituição do Brasil. São Paulo : Ed. Resenha Tribu-
tária, 1988. p. 241 - 269.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

CONGRESSO RESISTE EM ACABAR COM O VOTO SECRETO



27/11

Fonte: G1

Proposta tramita há seis anos na Câmara dos Deputados e já entrou 102 vezes na pauta.
Fim do voto secreto ganha ‘ritmo’ em período eleitoral.

Após seis anos de debates, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que termina com o voto secreto na análise de processos de cassação continua na gaveta da Câmara dos Deputados. E, de acordo com anúncio do próprio presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), não será em 2007 que o quadro mudará. “Nossa prioridade está definida. Mas [sobre o fim do voto secreto] não há entendimento”, disse Chinaglia ao G1.

O texto já passou por diversas comissões e até foi aprovado em primeiro turno no plenário, mas ainda não se transformou em alteração na Constituição Federal. Além da votação em segundo turno na Câmara, ainda falta ser analisada pelo Senado.


Apoio maciço

Em cinco de setembro de 2006, faltando menos de um mês para as eleições que renovariam a composição do Congresso, a Câmara aprovou, em primeiro turno, o fim do voto secreto em todas modalidades (processos de cassação, aprovação de autoridades indicadas pelo governo, vetos presidenciais e eleições da Mesa Diretora) com o apoio maciço dos parlamentares: 383 votos sim, quatro abstenções e nenhum voto contrário.

No entanto, passados um ano, dois meses e 20 dias, a votação da PEC em segundo turno prossegue listada como parte da pauta, mas jamais é colocada em votação.

A proposta esteve em condições de ser votada em plenário por 102 vezes, contabilizando-se apenas as sessões posteriores à aprovação do relatório para análise da PEC em segundo turno. “O voto secreto é poder. É poder de negociação, sem o ônus do desgaste público. Os líderes são pressionados e não permitem a votação”, avalia o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), que integra um grupo parlamentar de defesa do voto aberto.


Assinaturas

De acordo com Gabeira, o grupo já reuniu 15 mil assinaturas de apoio ao fim do voto secreto e, mesmo assim, não consegue convencer os colegas sobre a importância da proposta. Ele ressalta que a pressão popular é tamanha que, para evitar o fim do voto secreto, o único caminho é impedir a votação. “Não se trata de aprovar ou rejeitar. A única forma de impedir [a aprovação] é não votar”, disse.

O fim do voto secreto começou sua longa jornada em nove de maio de 2001. A proposta é de autoria do então deputado Luiz Antônio Fleury Filho (PTB-SP). Ela foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em 30 de outubro de 2002.

Em junho de 2004, dois anos depois (em tempo de eleição municipal, da qual participam diversos parlamentares), a Câmara retomou o debate sobre a matéria e criou a comissão especial. O parecer do deputado José Eduardo Cardoso (PT-SP), favorável ao voto aberto, foi aprovado em dezembro daquele ano. “Não tem razão para não votar. É imperativo que se termine com o voto secreto. Do jeito que está, o Conselho de Ética só serve para marcar posição”, acredita o deputado Gustavo Früet (PSDB-PR).

De acordo com dados oficiais da Câmara, nas 102 vezes em que matéria entrou em pauta três motivos serviram como justificativa para que a proposta não fosse analisada: acordo de líderes, pauta trancada por medidas provisórias ou cancelamento da ordem do dia. “Essa matéria não tem acordo. Eu, particularmente, tenho posição contrária [ao fim do voto secreto]. Por exemplo, na eleição da Mesa, tem que haver voto secreto”, defende o líder do PR, Luciano Castro (RR).


Entendimento

Como argumento para tanta dificuldade, os deputados dizem que a proposta aprovada em primeiro turno não foi debatida detalhadamente e que existem casos, como na analise de vetos presidenciais e das eleições à Mesa, em que o voto secreto ‘protege’ parlamentar da pressão do governo. “O problema é a falta de consenso político. Enquanto não houver, não tenha dúvida de que não será votada”, analisa do deputado Flávio Dino (PCdoB-MA).

Sem voto aberto, apenas três ex-deputados (Roberto Jefferson, José Dirceu e Pedro Correa), de 16 denunciados pela CPI dos Correios por conta do episódio do mensalão, tiveram o mandato cassado pelo plenário da Câmara. Todos 16 respondem processo penal no Supremo Tribunal Federal pela acusação de envolvimento com o escândalo.


Senado

No Senado, uma proposta que termina com o voto secreto foi aprovada neste ano pela Comissão de Constituição e Justiça. A matéria chegou ao plenário, mas retornou à CCJ a partir de uma manobra do PMDB, partido de Renan Calheiros (AL).

Mesmo que a matéria fosse aprovada neste ano, porém, o voto aberto em processos de cassação dificilmente valeria para análise do processo de cassação contra Renan. Isto porque os processos contra o parlamentar foram impetrados conforme a regra atual, ou seja, com a previsão de voto secreto.

Os próprios aliados de Renan acreditam que, se a votação fosse por meio de voto aberto, o peemedebista seria cassado e ficaria por 15 anos afastado da vida pública.

ESCÂNDALOS NO SENADO











segunda-feira, 22 de junho de 2009

PEC, PERMITE A CANDIDATURA AVULSA


Cargo eletivo
PEC permite a candidatura avulsa
16.Jun.2009 | Brasília - O senador Paulo Paim (PT-RS) defendeu a aprovação de Proposta de Emenda à Constituição (PEC 21/2006) de sua autoria, que permite a apresentação de candidaturas avulsas a qualquer cargo eletivo. A medida deverá ser votada nesta quarta-feira (17) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. A proposta determina que uma pessoa possa apresentar sua candidatura, mesmo não estando filiada a nenhum partido político, desde que contando com um número mínimo de apoios firmados, que deverá ser fixado em lei.
Falando da tribuna do Senado, ontem, Paulo Paim comentou que os adversários de sua proposta argumentam que ela enfraqueceria os partidos. Para contra-argumentar, o senador citou o caso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi eleito pelo Partido dos Trabalhadores.
"Se me perguntam: qual é o mais forte, o Lula ou PT, a minha resposta será, queiramos ou não, o presidente Lula, é só ver nas pesquisas", afirmou Paim.
Paulo Paim citou reportagem publicada na edição semanal do Jornal do Senado, com data de 15 a 21.06.2009, revelando que o Brasil faz parte de um pequeno grupo de países em que as candidaturas avulsas não são permitidas. O senador indagou o porquê de o Brasil não permitir esse tipo de direito ao cidadão que, segundo a publicação, está disseminado por quase 90% dos países do mundo.
"Sou a favor, porque sou a favor, também, do voto facultativo e do parlamentarismo, para que o Congresso não fique sendo apenas uma Casa de homologação de medidas provisórias, como é hoje", disse Paim.
Aposentados
O senador defendeu também o fim do fator previdenciário, e conclamou os deputados a votarem a favor dessa medida, que, segundo informou, deverá estar na pauta de votações da Câmara dos Deputados, ainda nesta semana. Da mesma maneira, o parlamentar gaúcho defendeu o voto pela derrubada do veto presidencial ao reajuste dos benefícios previdenciários, medida que deverá ser examinada pelo Congresso Nacional no próximo dia 8 de julho. (Agência Senado).

LISTA FECHADA


reforma política
Lista fechada é golpe


A “esperteza” dos deputados federais contra os eleitores e contra a soberania popular, tentando instituindo o voto em listas fechadas (para deputados federais e estaduais e para vereadores), já começou a render frutos.

A maioria esmagadora (ou esmagada?) dos eleitores tomou conhecimento do que seja o voto em lista. Muito bom.

Informação é poder. E os nobres deputados não estavam nem um pouco interessados em que os eleitores tivessem acesso a essas informações.

Estavam prontos para votar mais esta pouca-vergonha. E depois, bom, depois seria o fato consumado.

Mas um bocado de gente se esforçou para estragar a tentativa de golpe dos deputados.

Jornalistas, cientistas e analistas políticos, deputados e senadores que são contra este golpe (sim, eles existem!) passaram os últimos dias explicando, explicando, explicando.

Então, para recolocar os pingos nos iis, vamos lá.

O Brasil pratica um tipo muito peculiar de voto proporcional. Lista aberta (o eleitor escolhe seu candidato), coligações em eleições proporcionais (juntando cobra, jacaré e elefante no mesmo palanque) e um mecanismo inteiramente perverso de distribuição das sobras eleitorais.

Resultado: o eleitor vota num candidato honestíssimo... e seu voto pode servir para eleger um bandido. O eleitor brasileiro não tem a menor idéia de quem foi eleito com o seu voto.

Não custa lembrar: nas eleições de 2006, apenas 39 deputados federais, em todo o Brasil, atingiram o quociente eleitoral de seus estados.

Em outras palavras: apenas 39 deputados federais se elegeram com os próprios votos. Os restantes 474 se elegeram com votos da coligação e das sobras eleitorais.

O atual presidente da Câmara, dep. Michel Temer, por exemplo, foi o último colocado no PMDB. Quase não é eleito, precisou dos votos da coligação e das sobras. Mas hoje é o todo-poderoso presidente da Câmara dos Deputados. Pode?!

O sistema está inteiramente distorcido. A vontade do eleitor é inteiramente desrespeitada. A distância entre o representado e o representante (que não representa mais ninguém, apenas ele mesmo).

O sistema eleitoral brasileiro deixou de reproduzir suas virtudes, reproduz apenas seus defeitos.

A solução seria reconciliar representantes e representados, reaproximar os deputados dos eleitores.

Mas não. Acuados por uma impressionante onda de escândalos sucessivos, suas excelências estão com medo de não serem reeleitos em 2010.

(O Congresso brasileiro apresenta das mais altas taxas de renovação no mundo. Portanto, o mandato dos atuais deputados pode estar correndo sério risco.)

E a resposta aos escândalos, qual é? O voto em lista fechada, para garantir a reeleição! Vejam só!

Vamos lembrar: na lista fechada, o eleitor não vota em um candidato, mas numa lista partidária. É o que conhecemos hoje como voto de legenda.

Se o partido ou a coligação fizerem votos necessários para eleger, digamos, 20 deputados num determinado estado, os 20 primeiros da lista estão eleitos.

Isto significa que acaba a renovação, fortalece-se o poder dos caciques partidários, da turma que controla o aparelho dos partidos. E também dos atuais deputados e vereadores. Adeus, renovação.

Escondidos dentro de uma lista fechada, os deputados podem “se lixar para a opinião pública”, como declarou ontem o deputado Sergio Moraes (PTB-RS). Ele tem razão.

Com o voto em lista fechada, os bons deputados servirão de biombo para todo tipo de meliante que se candidata para ter acesso aos cofres públicos e ao foro privilegiado.

Suas Excelências darão uma banana para a sociedade e farão campanha apenas dentro dos partidos. E o eleitor terá cassado o direito de escolher seu candidato e votar nele.

Como escapar do impasse entre continuar com um sistema eleitoral inteiramente falido e embarcar neste golpe que é a eleição em lista fechada?

Uma proposta que mereceria ser analisada é a do distritão.

O projeto, do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), é bem simples. Para a eleição de deputado federal e estadual, por exemplo, o estado é o distrito. Serão eleitos os mais votados, acabando com votos de coligação e com sobras eleitorais.

No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, são 46 deputados federais. Os 46 mais votados seriam considerados eleitos, independentemente do partido pelo qual se candidataram. Mas seriam eleitos com os próprios votos.

Atualmente, são 70 os deputados estaduais fluminenses. Da mesma forma, os 70 primeiros seriam considerados eleitos.

Mantém-se a proporcionalidade, reaproxima-se o deputado do eleitor e não se impede o eleitor de votar em seu candidato.

Simples, não?

O único problema é que os candidatos teriam que mostrar sua cara, dialogar diretamente com o eleitor e, uma vez eleitos, teriam que andar na linha e prestar contas do exercício do seu mandato.

Como o eleitor saberia perfeitamente quem foi eleito e quem não foi, a cobrança ficaria mais fácil.

Talvez, exatamente por esta transparência e por esta exposição dos políticos diante de seus eleitores, este projeto do distritão não corre o menor risco de ser aprovado.

Uma pena.
Lista fechada perde força na reforma política

AE - Agencia Estado


BRASÍLIA - Os maiores partidos da base de apoio ao Palácio do Planalto recuaram e desistiram de aprovar a eleição por meio de lista partidária fechada - na qual os eleitores votam no partido e não no candidato diretamente - e caminham para enterrar a proposta de realizar uma reforma política neste ano. A reação negativa de PSB, PR, PP, PTB levou o PMDB e o PT a abandonar a lista fechada para as próximas eleições e evitar qualquer tema que sirva para desagregar a base, o que poderia provocar consequências negativas na construção de alianças.



A avaliação foi feita em reunião na noite de terça-feira entre os líderes da base, o ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), na casa do vice-líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR). Segundo um dos participantes, não é possível fazer algo que obrigue partidos da base a entrar em campos opostos.



O grupo considerou que há uma movimentação política grande no momento e que seria inteligente preservar a base para impedir, entre outros resultados, o assédio de outros candidatos aos partidos da base. Outro efeito colateral da insistência em aprovar a lista fechada seria a obstrução de votações de interesse do governo na Câmara. ?O ideal não é fazer alteração para agora, mas para 2014. Quero viabilizar a reforma política?, considerou o líder do PT, deputado Cândido Vaccarezza (SP). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

domingo, 21 de junho de 2009

Mídia sem máscara-ENTREVISTA

PARLAMENTARISMO






O sistema parlamentarista ou parlamentarismo é um sistema de governo no qual o poder Executivo depende do apoio direto ou indireto do parlamento para ser constituído e para governar. Este apoio costuma ser expresso por meio de um voto de confiança. Não há, neste sistema de governo, uma separação nítida entre os poderes Executivo e Legislativo, ao contrário do que ocorre no presidencialismo.

Costuma-se apontar como vantagens do parlamentarismo sobre o presidencialismo a sua flexibilidade e capacidade de reação à opinião pública: este tipo de sistema prevê que as crises e escândalos políticos possam ser solucionados com um voto de censura e a correspondente queda do governo e, até mesmo, a eventual dissolução do parlamento, seguida de novas eleições legislativas, sem ruptura política. Seus críticos, por outro lado, ressaltam o caráter freqüentemente instável dos governos formados no parlamentarismo, como no caso da República de Weimar e da Quarta República francesa.

Tendo em vista que o governo é formado a partir da maioria partidária (ou de coalizão) no parlamento e pode ser demitido antes da data prevista para as eleições regulares, o sistema parlamentarista distingue entre os papéis de chefe de Estado e chefe de governo, ao contrário do presidencialismo, onde os dois papéis são exercidos pela mesma pessoa. No parlamentarismo, o chefe de Estado normalmente não detém poderes políticos de monta, desempenhando um papel principalmente cerimonial como símbolo da continuidade do Estado. Nas repúblicas parlamentaristas, o chefe de Estado é eleito pelo voto popular ou nomeado pelo parlamento, por prazo determinado (geralmente com o título de presidente da República); nas monarquias parlamentaristas, o chefe de Estado é o monarca, geralmente um cargo hereditário. Já o chefe de governo, com o título de primeiro-ministro (ou, em alguns casos, presidente do governo ou chanceler), efetivamente conduz os negócios do governo, em coordenação com os demais ministros membros do gabinete.

Alguns países parlamentaristas atribuem ao chefe de Estado certos poderes, como a chefia nominal das forças armadas ou a prerrogativa de dissolver o parlamento, caso este não logre formar um governo tempestivamente, convocando então novas eleições. Se o sistema político de um país faz com que o chefe de Estado e o chefe de governo compartilhem o poder Executivo, o regime é mais corretamente chamado de semipresidencialismo.

Funcionamento

Em geral, os membros do parlamento são eleitos pelo voto popular, com base quer no sistema proporcional, quer no uninominal distrital. Após as eleições legislativas, escolhe-se o chefe de governo – o primeiro-ministro -, seja por convite formulado pelo chefe de Estado ao representante da maioria no parlamento, seja por votação no legislativo.

Uma vez eleito, o primeiro-ministro deve controlar a maioria dos assentos e evitar a formação de uma maioria absoluta contra o governo no parlamento, ou arriscará um voto de censura, que tem o condão de provocar a demissão do gabinete. O governo também pode ser demitido caso não consiga aprovar, no legislativo, uma moção de confiança; em alguns países, certos projetos de lei, como o orçamento, são sempre considerados moções de confiança.

Caso o gabinete seja demitido, o parlamento deverá escolher um novo governo, com base na maioria partidária ou por meio de uma coalizão. Normalmente, quando o legislativo é incapaz de decidir-se acerca do novo governo ou caso haja uma sucessão de gabinetes instáveis em determinado período de tempo, o parlamento é dissolvido e novas eleições são convocadas.

Gabinete

Em muitos países parlamentaristas, os ministros são vistos como coletivamente responsáveis pelas políticas do governo. A depender do país, o consenso pode ser obrigatório para as decisões no seio do gabinete.

VOTO FACULTATIVO EM PAUTA



Cedido Por: Dr. Zulmir Rasch


Não se sabe ao certo por que razão o voto no Brasil ainda é obrigatório, quando na maioria das democracias representativas o exercício deste direito civil, apesar de importante, é facultativo, cabendo a cada cidadão exercitar o seu livre arbítrio na hora de votar, reservando-se o direito de não comparecer às urnas se não quiser. A essência do voto facultativo é a sua qualidade que o valoriza e pressupõe ampla liberdade do cidadão de votar ou não, deixando falar mais alto a sua consciência política, sem coercitividade constitucional e por auferir melhor a vontade do eleitor.

Os que defendem a manutenção da obrigatoriedade do voto alegam que o povo brasileiro não tem ainda a chamada “ consciência política”, e que seria perigoso, desprovido dela, permitir que praticasse o seu livre arbítrio eleitoral. O que acontece é que muitos políticos - de todos os níveis, e a grande maioria daqueles que vivem à custa de votos, têm verdadeiro pavor de uma eleição desobrigada, pela massa de eleitores que se fariam ausentes, pois sabem que o desprestigio e a descrença do povo com a classe política é abismal, fato comprovado pelas pesquisas abalizadas de opinião pública.

Razões para isso não faltam e são constantemente divulgadas pela imprensa: questões como a infidelidade partidária, quando vereadores e deputados mudam de partido como quem troca de roupa; a corrupção política e partidária que conduz ao enriquecimento ilícito; o fisiologismo político e a demagogia desbragada, são fatores que solapam, de forma irreversível, a confiança do povo nos seus representantes e, por extensão, nos partidos sob cujas legendas se abrigam. É evidente que num regime de livre sufrágio, o número de eleitores interessados em participar do processo eleitoral para a escolha dos seus representantes, sempre será bem menor que num sistema de obrigatoriedade do voto, que inclusive ameaça os abstêmios com multas e outras penalidades. Entretanto, o número de votantes será diretamente proporcional ao nível de conscientização política desenvolvido pela população. Serão esses, porém, votos de qualidade e de consciência, e cada candidato terá que convencer as pessoas a nele votarem com argumentos consistentes e programas de governo factíveis de serem realizados. A credibilidade pública do candidato valerá muito e será decisiva.

É comum ouvir-se de que o voto sendo facultativo favoreceria a sua troca por pequenos favores. Em primeiro lugar, seria hipocrisia afirmar que no modelo atual – do voto obrigatório, não ocorre, em larga escala, a deplorável “venda” do voto, considerado por muitos como coisa natural. Há quem venda o seu voto porque existe quem o compre. Analisando por este prisma, é de se perguntar o que facilitaria mais a troca do voto por pequenos favores, o fato de o eleitor ter que, obrigatoriamente, comparecer às urnas, sob pena de multa, ou, ao contrário, o fato de o eleitor só comparecer à seção eleitoral movido pela sua consciência ? Fica evidente que o voto obrigatório é o indutor dessa “venda” . O eleitor que não tem consciência da importância do seu voto pensa: “se eu tenho que votar, que eu tire algum proveito imediato”! Fortalece essa afirmação o fato de que pesquisas demonstram que mais de 80% dos eleitores não se lembram do nome do deputado federal que votou no último pleito. Tal raciocínio nos leva a afirmar que o voto facultativo, por valorizar o voto de qualidade, por motivar o comparecimento às urnas motivado pela consciência política, pela expectativa de uma representação identificada com suas aspirações, pela confiança num projeto político, levará às urnas o eleitor disposto a investir no futuro do seu Município, Estado ou Nação, que confia na possibilidade da construção de um país melhor para seus filhos ou netos, que acredita que o exercício da cidadania é pressuposto de qualquer Nação. É bom destacar que a adoção do voto facultativo aumentará a responsabilidade dos Partidos Políticos na medida que deverão escolher candidatos identificados com as aspirações da comunidade que pretende representar.

Somos convictos que os resultados de uma eleição com o voto facultativo espelhariam com maior fidelidade a vontade popular. Haveria uma depuração natural, um afastamento pela via democrática dos políticos que não mostraram serviço no decorrer do seu mandato, dos candidatos que demonstram não ter condições para exercer um mandato eletivo. A escolha seria precisa, cristalina e, principalmente, consciente, eis que a grande maioria daqueles que resolvessem votar, obviamente já teriam os seus candidatos, estando imunes, portanto, ao assédio dos “bocas de urnas”. O brilhante senador José Fogaça ao defender a emenda constitucional que altera o caput e o § 1º do art. 14 da Constituição Federal, destacou que “é bom que se ressalte que o direito de escolher, diretamente, seus representantes, é uma prerrogativa inerente à cidadania. O voto é, pois, um direito do cidadão, é a hora sublime do exercício da democracia, visto que é o momento em que o poder é exercido diretamente pelo povo. Ao tornar-se obrigatório, deixa de ser um direito e passa a ser uma imposição. Deixa de ser a livre manifestação para transformar-se em manifestação forçada, que caracteriza ausência de liberdade. O voto facultativo deve ser, portanto, encarado como um direito e não como uma obrigação, um dever”.

fonte: mudabrasil.com



Senadores transformam em PEC sugestão feita por associação de moradores e reacendem debate sobre o fim da obrigatoriedade do voto no Brasil

Fábio Góis

Em época de eleições, a pergunta é recorrente: o voto deve ser obrigatório ou facultativo? Muito é discutido, mas pouco muda no sistema eleitoral brasileiro. Pois a discussão volta com força às vésperas do pleito municipal de outubro. Em junho deste ano, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participa

tiva (CDH) do Senado converteu em proposta de emenda constitucional uma sugestão feita por uma associação comunitária em favor do voto facultativo.

A proposição mantém a obrigatoriedade de o cidadão tirar e guardar o título de eleitor (apenas para efeito estatístico e de cadastro), mas o livra da obrigatoriedade de votar a cada dois ou quatro anos (no caso do DF), como ocorre hoje.

Com parecer favorável do relator, Eduardo Suplicy (PT-SP), a matéria foi encaminhada para a apreciação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, onde aguarda designação de relator.

“Eu vejo que, no processo de aperfeiçoamento da democracia, podemos considerar como didático que tenha havido o voto obrigatório desde a [promulgação] da Constituição de 1988”, disse Suplicy ao Congresso em Foco. Mas, para o senador paulista, a população brasileira já assimilou a importância do voto. “Acho que podemos passar para o estágio do voto facultativo. Portanto, acolhi essa sugestão popular.”

Mudança positiva

Para Suplicy, a não obrigatoriedade do voto pode provocar uma positiva mudança de comportamento por parte dos eleitores. “Será importante passarmos para a fase em que as pessoas votem não por obrigação, mas por vontade.”

O petista disse não ter idéia do tratamento que os senadores darão à matéria em plenário, mas que ela foi bem recebida pelos membros da CDH. “Passou sem objeção. Só na hora do debate vamos verificar o que vai acontecer, não posso adiantar. Há senadores contra e a favor da proposta.”

Convertida na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 28/08 no dia 20 de junho na CDH (leia mais), a sugestão apresentada pela Associação Comunitária de Chonin de Cima (Acocci), de Governador Valadares (MG), visa a alterar o artigo 14 da Constituição Federal, que torna obrigatório o voto no processo eleitoral do país.

País despreparado

A idéia do voto facultativo não é bem vista pelo cientista político Cristiano Noronha, da empresa de consultoria Arko Advice. Noronha discorda de Eduardo Suplicy e crê que a população ainda não está preparada para lidar com o voto facultativo no Brasil.

“Eu sou contra. O Brasil ainda precisa chegar a um estágio de funcionamento institucional e educacional mais elevado para instituir o voto facultativo. As pessoas têm de se conscientizar mais sobre a importância do voto”, declarou Noronha, para quem o país ainda está “institucional e socialmente despreparado” para o voto não obrigatório.

Para o cientista político, o efeito da instituição do voto facultativo no processo eleitoral brasileiro seria negativo. “Teríamos um índice de abstenção, votos brancos ou nulos muito alto, veríamos isso aumentar consideravelmente. Aliás, votos brancos e nulos se transformariam em ausência. O efeito natural disso vai ser o não comparecimento“, argumentou Noronha.

“Do ponto de vista constitucional, não há por que rejeitar [a proposta]. Não se está ferindo nenhuma cláusula pétrea. Mas isso não quer dizer muita coisa”, ressalvou, acrescentando que “temas muito mais urgentes e importantes” que a questão do voto obrigatório devem ser discutidos pela sociedade.

Totalitarismo

Não é o que pensa o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), para quem o assunto é uma boa oportunidade para a “discussão de uma reforma política que não sai do chão” no Parlamento. Segundo o vice-líder tucano, a pertinência do tema é mais uma razão para levá-lo ao debate no Congresso.

“Se o eleitor acha que não tem motivos para dar seu voto, por que ser obrigado a votar? Cabe aos políticos ter mais competência para convencê-los”, completou Alvaro, autor de uma proposição semelhante em trâmite na CCJ do Senado, a PEC 14/2003.

“O voto obrigatório tem sido a marca registrada dos estados totalitários, onde o governante necessita desse subterfúgio para compelir o comparecimento aos pleitos e dar uma aparência de legalidade a um regime de força”, diz trecho da justificativa da proposta de Alvaro Dias.

Obrigatoriedade em xeque

Pesquisa encomendada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) ao Instituto Vox Populi revelou que, se o voto fosse facultativo, 38% dos eleitores não iriam às urnas registrar sua preferência. Entre esses, 30% disseram que “com certeza não iriam votar” e 8% que “provavelmente não iriam votar”.

A pesquisa, realizada entre 27 de junho e 6 de julho com o objetivo de traçar um perfil do eleitor brasileiro, revelou ainda que 51% dos entrevistados disseram que votariam mesmo sem a obrigatoriedade, enquanto outros 11% “provavelmente votariam”. Das 1.502 pessoas consultadas em todas as regiões do país, apenas 1% disse não saber o que responder.

“A possibilidade de a pessoa votar em benefício próprio existe tanto no voto facultativo quanto no voto obrigatório”, disse Suplicy. “Não creio que as pessoas, por causa do voto facultativo, venham se sujeitar a vender seu voto. No [voto] voluntário, no entanto, fica mais difícil fazer [a indução ilegal].”

Desserviço ao país

A posição do senador paulista não é compartilhada pelo presidente da Comissão de Acompanhamento Legislativo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcos Vinicius Furtado Coelho, para quem o voto facultativo seria “um desserviço ao combate à corrupção eleitoral”.

“Com o voto facultativo, haveria a compra da ausência, isso poderia ser controlada pelo corruptor”, disse o advogado, especialista em direito eleitoral. Na avaliação dele, principalmente em cidades pequenas, políticos corruptos poderiam dar dinheiro para grupos de eleitores não comparecerem às urnas e votar nos adversários.

Marcos Vinicius disse ainda que, na prática, o voto facultativo diminuiria a participação popular no processo eleitoral, bem como “a representatividade dos que forem eleitos”.

“Do ponto de vista do fundamento, o voto é um direito e um dever do cidadão, que deve participar da vida política do seu país. [O cidadão] só é obrigado a comparecer, e não a definir seu voto. São obrigações da vida civil” completou o advogado, enfatizando que essa é uma opinião pessoal, e não um posicionamento oficial do Conselho Federal da OAB, do qual é membro.

Caminho longo

Como se trata de alteração na Carta Magna, a PEC 28/08 precisa, caso seja chancelada também na CCJ, da aprovação em plenário de pelo menos 49 senadores, em dois turnos, para depois ser remetida à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

Analisada pelo colegiado, a proposição teria de ser examinada por uma comissão especial antes de ser submetida aos deputados em plenário, em dois turnos de votação. São necessários pelo menos 308 votos (3/5 dos 513 deputados). Caso seja alterada na Câmara, a matéria terá de voltar ao Senado.

Assembléia Constituinte

Assembléias surgiram antes da independência americana
Renato Cancian*
Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
Uma Assembléia Constituinte é um órgão colegial representativo, de caráter extraordinário e temporário, que é investido do poder de elaborar a Constituição, ou seja, o conjunto de regras normativas primárias e fundamentais do ordenamento jurídico estatal.

Historicamente, um órgão dessa natureza e com essa função só é formado em casos excepcionais, quando se origina um novo Estado soberano ou quando da necessidade de um novo ordenamento jurídico para substituir o ordenamento precedente, em razão da ocorrência de grandes mudanças ou de ruptura da ordem social e/ou política. Como fonte de produção das normas constitucionais, até encerrar suas funções o poder constituinte é soberano.

Origens do constitucionalismo moderno
As origens históricas da Assembléia Constituinte remontam ao período do século 18 e estão associadas à emergência das doutrinas contratualistas.

A origem do pensamento contratualista remonta à filosofia grega, mas ele adquiriu importância teórica e política somente no pensamento liberal moderno, que considera a sociedade humana e o Estado originados por um acordo ou contrato estabelecido entre cidadãos autônomos, valorizando desta maneira a liberdade individual, geralmente em detrimento da autocracia ou dos excessos da ingerência estatal.

As doutrinas contratualistas tinham provocado, assim, uma ruptura com as formas de legitimação do poder político. Desse modo, os poderes dos Estados e dos governantes passaram a ser concebidos como emanações da vontade de todos os membros da comunidade; ou seja, dos cidadãos, que passaram a ser os titulares do poder soberano.

Porém, dada a impossibilidade da participação política direta de todo o povo nos assuntos de interesse coletivo, recorreu-se à fórmula do governo representativo e à eleição de representantes políticos. Neste aspecto, uma assembléia constituinte tem as mesmas características de um órgão representativo que expressa a vontade popular.

As primeiras experiências políticas que propiciaram o surgimento da assembléia constituinte estão associadas com a luta das colônias inglesas americanas para se separar da Grã-Bretanha. No período que precedeu a Declaração de Independência Americana, as colônias desprovidas de órgãos governamentais consolidados e estáveis se articularam em torno do objetivo de se organizarem politicamente. O resultado desse processo foi o surgimento, em cada uma das colônias (que depois se transformaram em Estados), de assembléias eleitas cuja principal função foi a elaboração de cartas constitucionais.

Depois dos Estados Unidos, a primeira assembléia constituinte européia surgiu na França revolucionária, em 1789, e foi chamada de Assembléia Nacional Francesa.

A partir do século 19, as assembléias constituintes passaram a ser o meio político por excelência da criação das cartas constitucionais dos modernos Estados democráticos. Houve, por exemplo, uma tentativa de convocação de uma assembléia constituinte na Rússia pré-revolucionária, por iniciativa dos partidos e movimentos políticos russos, tanto os de tendência liberal até os comunistas bolcheviques. Porém, as divergências e os conflitos políticos foram se acentuando de tal modo que bloquearam as possibilidades de a assembléia se concretizar. A tomada do poder pelos bolcheviques afastou as chances de criação de um sistema democrático-parlamentar na Rússia.

Tipologia
A história do constitucionalismo moderno deixa em evidência uma enorme e rica variação de experiências políticas em torno do poder constituinte.

Com relação à iniciativa do processo constituinte, fica claro que só é possível chegar à convocação de uma assembléia constituinte com o apoio dos grupos políticos dominantes. Por outro lado, no que se refere, propriamente, às funções constituintes, na maioria dos casos a assembléia constituinte é um órgão eleito especificamente com a finalidade de elaborar uma nova carta constitucional.

Porém, há vários casos históricos de atividade constituinte realizada por órgãos políticos já existentes que, por variadas razões, se transformaram em assembléias constituintes. Neste aspecto, o exemplo mais notório vem do caso dos governos provisórios na França, nos anos de 1789, 1848 e 1870 - e também no período de 1944-1945.

Por outro lado, na ausência de um ordenamento jurídico provisório, a abrangência das funções de uma assembléia constituinte pode variar enormemente. Uma assembléia desse tipo pode encarregar-se unicamente do trabalho de elaboração da nova constituição ou estender suas atividades para as tarefas legislativas e até para a função de direção política.

Na maioria das colônias americanas, por exemplo, as assembléias constituintes que foram criadas mantiveram-se em funcionamento e, depois da Independência, se transformaram em órgãos legislativos ordinários (parlamentos), passando a funcionar de acordo com as regras constitucionais em vigor.

Devemos considerar também a atividade constituinte propriamente dita. A primeira tarefa de uma assembléia constituinte é a elaboração de um projeto político preliminar, sobre o qual os debates e os trabalhos constituintes ocorrerão. O projeto preliminar pode ser obra de um conselho jurídico externo à assembléia ou se originar da própria assembléia, por meio da criação de comissões ou comitês. Por último, terminada a elaboração da carta constitucional, esta pode entrar em vigor por deliberação exclusiva da própria assembléia ou ser submetida à aprovação popular.

Revisão constitucional
Um outro aspecto muito importante se refere ao poder de revisão da carta constitucional. De modo geral, a carta constitucional estabelece as próprias condições e os casos nos quais pode ocorrer a revisão da Constituição.

É muito comum que os órgãos legislativos ordinários (parlamentos) se encarreguem dos procedimentos de revisão constitucional. Mas há casos em que esses procedimentos são deixados sob responsabilidade de assembléias especiais.

O trabalho de revisão constitucional feito por uma assembléia especial ou por um órgão legislativo ordinário não deve, porém, ser confundido ou equiparado ao trabalho de uma assembléia constituinte, pois o poder de revisão constitucional segue limites estabelecidos pela própria carta constitucional. Uma revisão constitucional serve, basicamente, para aprimorar ou adequar a carta constitucional às mudanças da sociedade.
*Renato Cancian é cientista social, mestre em sociologia-política e doutorando em ciências sociais. É autor do livro Comissão Justiça e Paz de São Paulo: gênese e atuação política - 1972-1985.